A gestão empresarial no Brasil talvez atravesse hoje o período mais crítico de seu desenvolvimento: sofre, por um lado, de outro, de uma formidável pobreza de reflexão autenticamente nacional. O mais das vezes, o que temos é a leitura ou a versão brasileira da contribuição estrangeira.
Grande parte dos males organizacionais decorre dessa lamentável falha de equilíbrio que se estabeleceu entre uns poucos privilegiados que, em grande maioria, meramente traduzem ou copiam não criticamente os compêndios editados na terra de Tio Sam e uma imensa massa de pequenos empresários e profissionais de administração que sequer leem qualquer coisa sobre a ciência dos negócios e a gestão das empresas.
A identidade da organização brasileira é uma incógnita, cujos valores se vêm tentando assistematicamente fixar por caminhos confusos e contraditórios. Não houve até agora um direcionamento consequente ou mesmo a tomada de consciência da atual situação que nos propicie o florescer de uma verdadeira concepção organizacional no país.
A atividade de vanguarda no desenvolvimento das organizações no Brasil tem, em geral, simplesmente consistido em copiar modelos de outros países, impondo-os às nossas organizações, sem o discernimento preciso e as adaptações adequadas. Limita-se a simples importação de técnicas e métodos com todos seus vícios e virtudes.
As culturas das organizações se improvisam tão pouco como os organismos racionais. Todos os processos artificiais ou postiços empregados no desenvolvimento das organizações são sempre tão improfícuos como os instrumentos cirúrgicos do Dr. Strangelove, que só conseguiu fazer de Frankenstein um híbrido monstruoso.
Os profissionais de Administração, deformados pela assimilação de valores e práticas alienígenas, deixam de considerar a organização em que trabalham por um ponto de vista brasileiro. Julgam, pelo contrário, as aparências organizacionais através de um prisma norte-americano ou europeu, maximizando ou subestimando as suas repercussões. E nisto está o mal de origem dos erros de raciocínio dos gestores tupiniquins estabelecem, de antemão, um abismo intransponível entre si próprios e a verdadeira essência da cultura organizacional em que atuam.
Devemos desconfiar da importação de modelos. Tomar a experiência internacional como ponto de referência importante, mas a utilizar apenas como parte do material disponível para a construção de nossas próprias ideias. Rejeitar o mimetismo, a cópia. Não ver a empresa brasileira como ufanisticamente superior às outras, mas descartar a noção subserviente de que ela se tem a aprender e nada ensinar. Não cair no particularismo nacional, mirrado e xenófobo, nem no internacionalismo xenófilo e estéril, que só serve para camuflar a inautenticidade e a alienação.
A vida da maioria das organizações brasileiras se inscreve no mesmo sistema de aparências que caracteriza a nossa cultura intelectual e moral. Com uma diferença: se a nossa elite intelectual não é mais do que uma cópia tentada às pressas de moldes estrangeiros, muitas vezes inadaptáveis, as nossas organizações só chegam a ser uma caricatura, engraçadíssima e pitoresca, do que pretendem imitar. Do “querer ser ao crer que já se é” vai a distância do trágico ao cômico. Essa é a diferença entre o sublime das intenções e o ridículo da realidade de muitas das nossas organizações, que não se envergonham de fazer o bufo tragicômico da pantomina, quando se apresentam, por exemplo, como organizações morais, empresas-cidadãs e de responsabilidade social, organizações espirituais, felizes e sustentáveis.
A definição da identidade e da cultura da organização brasileira é uma questão que não suporta mais adiamento indefinido. Esta não é apenas uma questão de natureza administrativa ou gerencial. É um capítulo da própria construção da nacionalidade brasileira. Não podemos, portanto, permitir-nos o desrespeito de continuar a tratar esta questão com tamanha displicência e pouco caso, dando ao mundo empresarial o mesmo servilismo científico-tecnológico que emprestamos à realidade das ciências em geral.
Adm. Wagner Siqueira
CRA-RJ nº 01-02903-7
Presidente