Com a pandemia e o quase congelamento da economia mundial, muitas empresas se viram em meio a diversas dívidas tributárias por problemas em seus fluxos de caixa, independente do seu porte, mas principalmente aquelas optantes pelo Simples Nacional. No entanto, existem algumas formas para parcelamento e melhor alternativa a seguir, além de cuidados específicos para a área.
Segundo a Receita Federal, 52% dos contribuintes inscritos no CNPJ são optantes pelo Simples Nacional, representando 20,8% da arrecadação. São 15,6 milhões de optantes, incluindo aqueles que são Microempreendedor Individual (MEI), que juntos arrecadaram R$ 103,3 bilhões em 2019. E apesar de o Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN) ter prorrogado o vencimento das apurações correspondentes aos meses de março, abril e maio de 2020, e ter adiado o vencimento das prestações dos parcelamentos no âmbito deste regime, o parcelamento dos débitos ou o reparcelamento pode ser bem atrativo para provocar um alívio no fluxo de caixa.
Nesta entrevista exclusiva, o Adm. Roger Belisário, consultor de Gestão e Finanças, afirma que as empresas que já atravessavam dificuldades financeiras em pagar o Simples Nacional, antes mesmos no coronavírus, também têm algumas alternativas para quitar com seus débitos tributários, principalmente se ele estiver com o risco de sofrer uma execução fiscal.
Confira quais são as opções para cada situação:
CRA-RJ – Qual débito que pode ser parcelado no Simples Nacional?
Adm. Roger Belisário: O Simples Nacional permite o parcelamento apenas dos débitos vencidos e não pagos. O valor é atualizado com multa de mora de 0,33% ao dia, até o limite de 20%. E, para cada mês vencido, acrescenta também a taxa SELIC sobre o débito.
CRA-RJ – Como funciona o parcelamento no Simples Nacional?
Adm. Roger Belisário: O parcelamento do Simples Nacional está previsto no §15 do Art. 21 da Lei Complementar 123/2006, ao atribuir ao CGSN a competência para fixar os procedimentos para sua formalização. Já na Resolução 140/2018, temos no Art. 46, diz que o prazo máximo a ser concedido é de 60 parcelas mensais, desde que o valor mínimo da parcela seja de R$ 300. Fazendo o pedido de parcelamento e indicando as competências que serão parceladas, a formalização é concluída com o pagamento da primeira parcela. Se a empresa deixar de pagar três parcelas, consecutivas ou não, perde o parcelamento.
CRA-RJ – Se a empresa perder o parcelamento, é possível parcelar novamente?
Adm. Roger Belisário: Sim, é possível fazer um reparcelamento. Neste caso, o débito será novamente consolidado com as correções moratórias. Só que, neste caso, se for o primeiro reparcelamento, o valor da primeira parcela será correspondente a 10% do débito consolidado. A partir do segundo reparcelamento, a primeira parcela corresponderá a 20% dele.
CRA-RJ – E se a empresa permanecer inadimplente com a Receita Federal? O que acontece?
Adm. Roger Belisário: Se a empresa permanecer inadimplente, a Receita Federal encaminha o débito para inscrição na Dívida Ativa. Quando o débito é inscrito em dívida ativa, significa que a Receita Federal esgotou seus mecanismos de cobrança em âmbito administrativo. No caso dos tributos, o “advogado” da Receita Federal é a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. É ela quem passa a administrar esses débitos e a prepará-los para uma execução fiscal.
CRA-RJ – É possível parcelar o débito inscrito em Dívida Ativa?
Adm. Roger Belisário: Sim, é possível, seguindo praticamente os mesmos critérios do parcelamento realizado pela Receita Federal. A diferença está no valor. Só por inscrever o débito em dívida ativa, haverá acréscimos de honorários de 10% e, se o processo tiver sido ajuizado, os honorários são de 20%. A Procuradoria repassa esse custo para o contribuinte. Porém, a partir deste ano temos uma novidade! Mais uma opção de parcelamento: a transação.
CRA-RJ – O que é transação?
Adm. Roger Belisário: A transação é uma forma de extinção de obrigações entre pelo menos duas partes, mediante concessões recíprocas. No âmbito tributário, a transação é uma modalidade de extinção do crédito tributário, prevista em nosso Código Tributário Nacional. Ela foi instituída pela Lei 13.988/2020 e permite à União negociar formas de quitação dos débitos dos contribuintes, observando os princípios da isonomia, da capacidade contributiva, da transparência, entre outros. Uma das finalidades de se realizar a transação é buscar maior eficiência na cobrança de créditos da Fazenda Pública, pondo fim a processos de execução fiscal que, muitas vezes, são duradouros e custosos.
CRA-RJ – Quem pode fazer transação para regularizar sua situação fiscal?
Adm. Roger Belisário: A transação pode ser realizada por qualquer contribuinte que não tenha cometido fraudes e que se enquadre nas modalidades previstas na legislação. Somente podem ser transacionados os débitos que estiverem inscritos em dívida ativa e considerados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação.
CRA-RJ – Como saber se o débito se enquadra como irrecuperável?
Adm. Roger Belisário: Foram estabelecidos alguns critérios para considerar o débito como irrecuperável:
- Ele deve estar inscrito há mais de 15 anos e sem anotação de garantia ou suspensão de exigibilidade;
- Suspenso por decisão judicial há mais de 10 anos;
- Se a titularidade do devedor for com falência decretada, em processo de recuperação judicial, em liquidação judicial ou em intervenção ou liquidação extrajudicial;
- Se a titularidade do devedor pessoa jurídica cuja situação cadastral do CNPJ esteja relacionada, em resumo, a algum caso de inaptidão;
- Se a titularidade do devedor pessoa física estiver com indicativo de óbito;
- Os respectivos processos de execução fiscal estiverem arquivados por mais de 3 anos por não ter sido encontrado o devedor ou bens sobre os quais possam recair a penhora.
CRA-RJ – Quais benefícios podem ser obtidos com a transação?
Adm. Roger Belisário: Os benefícios são desconto para os créditos de até 50% sobre o valor total da dívida, parcelamento do débito em até 84 meses; se for micro ou pequena empresa, o desconto pode chegar a 70% e o parcelamento a 100 meses. No caso da empresa estar em processo de recuperação judicial, pode haver carência de até 180 dias para o primeiro pagamento. Em todo caso, pode haver flexibilização das regras envolvendo prestação de garantias, penhora e alienação de bens; e se tiver algum crédito líquido e certo a receber da União ou precatórios federais próprios ou de terceiros, poderá ser utilizado para amortizar ou liquidar a dívida.
CRA-RJ – Quais são as modalidades de transação?
Adm. Roger Belisário: As modalidades de transação são: Por adesão; Extraordinária; Excepcional; Por proposta individual do contribuinte ou Por proposta individual da procuradoria.
Acordos por adesão: está disponível para contribuintes com dívidas inferiores a 15 Milhões de Reais, aferido por modalidade e por natureza da dívida;
Transação extraordinária: essa modalidade permite que a entrada correspondente a 1% do valor total das inscrições selecionadas seja paga em até três meses, e o saldo restante dividido em até 81 meses, desde que o valor mínimo da prestação seja de R$ 500. Mas se o débito for previdenciário, o número máximo de parcelas será de 60 vezes. Se a empresa já teve o débito parcelado, também pode aderir à transação extraordinária. Neste caso, por se tratar de reparcelamento, o valor da entrada será de 2% do valor total das inscrições selecionadas.
Transação excepcional: para dívidas de até R$ 150 Milhões. Essa modalidade permite o pagamento em até 12 meses da entrada correspondente a 4% do valor total das inscrições transacionadas. Além disso, o saldo poderá ser dividido em até 72 meses, com descontos de até 100% sobre os valores das multas, juros e encargos. Apenas deve ser respeitado o limite de até 50% do total da dívida e a capacidade de pagamento do contribuinte. O valor da parcela não poderá ser menor do que R$ 500. Se for micro e pequena empresa, paga-se a mesma entrada, da mesma forma, mas o saldo poderá ser dividido em até 133 meses e o limite de desconto sobre o valor total passa a ser de 70%. Ou seja: os 100% de desconto nos encargos não pode ser maior do que 70% da dívida. E o valor mínimo da parcela neste caso é de R$ 100.
Essas três modalidades de transação estão com editais publicados e prazo de vencimento para adesão: até 31 de agosto para os editais da transação por adesão e transação extraordinária, e até 29 de dezembro para a transação excepcional.
As demais modalidades, por proposta individual por parte do contribuinte ou da PGFN são destinados a grandes contribuintes, com dívidas superiores a R$ 15 Milhões.
CRA-RJ – O que as empresas do Simples Nacional devem fazer para aderir à transação excepcional?
A empresa deverá acessar o portal REGULARIZA da PGFN e fornecer, até o dia 29/Dez, e passar as informações necessárias para a consolidação da proposta de transação, que são:
- Endereço completo;
- Nome, CPF e endereço completo dos sócios, diretores, gerentes e administradores;
- Receita bruta mensal relativa aos anos 2019 e 2020, até o mês imediatamente anterior do mês de prestação das informações da proposta;
- Quantidade mensal de empregados registrados a partir de janeiro de 2020;
- Quantidade de admissões e desligamentos mensais em 2020;
- Quantidade de contratos de trabalhos suspensos em 2020;
- Balanço com valor total dos bens que a empresa possui, recursos que ela tem a receber de terceiros e dívidas que devem ser pagas no mês anterior à adesão.
A formalização da transação está condicionada ao pagamento de todas as parcelas de entrada.
CRA-RJ – Existe algum cuidado a ser tomado pela empresa que adere a alguma modalidade de transação?
Adm. Roger Belisário: A empresa tem que estar atenta ao cumprimento das condições, cláusulas e compromissos assumidos. O descumprimento do termo de transação ou a inobservância das disposições legais o do edital, podem acarretar a rescisão da transação. Outro ponto de atenção é relativo a seu patrimônio. Se ficar constatado que houve ato tendente ao esvaziamento patrimonial do devedor, ainda que realizado anteriormente à sua celebração, o contrato da transação pode ser rescindido. Além disso, se for verificada a ocorrência de fraude ou simulação quanto à pessoa ou ao débito, também é passível de cancelamento. Para todo caso, se for algo sanável, a empresa terá o prazo concedido para impugnação para regularizar e corrigir o vício. Se de fato for rescindida a transação, todos os benefícios são cancelados e implica a cobrança integral da dívida, deduzidos os valores já pagos, sem prejuízo de outras consequências previstas no edital.