*Adm. Wallace Vieira

A vida normaliza-se naquela anormalidade”, Euclides da Cunha em Os Sertões

O custo econômico experienciado pela crise vai ser alto. Terá consequências duradouras e será agravado por um mundo menos aberto, menos próspero e menos livre.

Além de medidas econômicas, mudanças sociais são necessárias, como bem disse Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, uma das maiores corretoras de valores do Brasil, em entrevista à Folha de São Paulo:

 

“Não somos uma sociedade coesa, que olha para o próximo. O sentimento de solidariedade tem que perpassar nossas relações. Além de reformas, vamos precisar de muito diálogo”.

 

Alinhada às sobrecitadas considerações, a ilustrada escritora polonesa Olga Tokarczuk, Prêmio Nobel de Literatura em 2018, na entrevista concedida também à Folha de São Paulo, em 1404/2020, adita os comentários que se seguem:

 

“A crise está se aproximando e vai certamente abalar os princípios que pareciam estáveis. Muitos países não conseguem lidar com ela e, em face de sua decomposição, nascerá uma nova ordem, como muitas vezes acontece depois de uma crise. Percebemos aos poucos que nada será como antes”.

 

O Brasil que sairá da crise do coronavírus terá que vencer uma recessão profunda e duradoura em um cenário extremamente diverso e com missão fiscal redobrada.

Ademais, há muita razão para pessimismo, em particular no futuro próximo, em face de frustração acumulada, perda de status, desemprego e aumento da pobreza extrema. Haverá um longo período de dificuldades, mesmo depois do fim da restrição sanitária.

No entanto, a pandemia mostra que outra realidade é possível. Como vê a historiadora e antropóloga Leila Schwarcz (USP e Princeton University), quando afirma:

 

Toda crise também abre uma fresta.”

Ou seja, a pandemia do coronavírus está forçando muita gente a rever seus conceitos a partir do legado de novos valores que deixa, sobretudo o legado solidário que, certamente, orientará profundamente a forma como organizaremos nossas instituições. Parece ainda que haverá um novo paradigma de produção baseado na modernização e simplicidade, na reciclagem, na distribuição igualitária de recursos, na redução de jornada de trabalho, na adoção completa de tecnologias que substituem o trabalho humano, na renda básica etc.

E mais, que a crise revela mudanças no comportamento corporativo, social e pessoal que vieram para ficar. Algumas mudanças já acontecem, são frutos da necessidade de sobrevivência e sustentabilidade e revelam novos caminhos para as instituições, seus empregados, seus clientes e fornecedores. A organização do trabalho sob o regime do trabalho remoto é o mais eloquente exemplo de mudança forçada pela pandemia que veio para ficar, e que levou ainda as pessoas a redescobrirem que podem viver mais para si mesmas e para a família; e que se os novos hábitos persistirem no mundo corporativo deverá haver um salto enorme de produtividade.

Em suma, a recessão provocada pela pandemia pode inspirar a construção de arranjos e alternativas corporativas e sociais mais igualitárias. Ao sair da crise serão valorizadas empresas mais solidárias.

Por sua vez, o novo Conselho Regional de Administração do Rio de Janeiro, como a fênix da mitologia grega, nascerá certamente das próprias cinzas, decorrente do caos legado pelo coronavírus. Desta vez, mais forte, coeso e integrado.

Oxalá, nada será como antes amanhã; embora saibamos que as lições são aprendidas por uma parte, mas há uma outra parte que só quer voltar ao normal.

No sentir do ilustrado filósofo, educador e escritor Mário Sérgio Cortella, em recente entrevista à Folha de São Paulo:

 

A pandemia não vai converter a humanidade à solidariedade; muitos vão querer voltar ao normal”.

 

Diz, ainda, Cortella:

 

“Quando se olha a humanidade ao longo da história, percebe-se que nunca demos sinais de que aquilo que nos traumatiza, quando termina, nos redime”

 

A crise deu-nos a chance de nos unir, provar nossa humanidade, reacender o espírito de equipe, o sentimento de utilidade, pertencimento e de cidadania, e renascer nas pessoas o amor ao próximo: mais empáticas e resilientes, frente aos desafios que ora se apresentam.

A crise mostrou também uma organização mais coesa, integrada e comprometida pelos benefícios que o clima compartilhado oferece, mesmo tendo seus participantes compartimentados e isolados socialmente. Há um pressuposto generalizado de que os componentes de uma organização desejam participar de seus processos decisórios e estejam dispostos a fazê-lo em qualquer circunstância.

Em outras palavras:

 

Cria-se, em relação às decisões compartilhadas, uma espécie de ética que favorece a superação de um dos principais desafios com que se defrontam as organizações: o da motivação das pessoas para agir no sentido desejado.

 

Por decorrência, o CRA-RJ não sofreu solução de continuidade nas suas ações, limitadas, apenas, pelo distanciamento social imposto pelas autoridades sanitárias à sociedade.

Vem contribuindo para tanto, certamente, além da qualidade profissional dos recursos humanos do CRA-RJ, o avanço do estágio de inovação e modernização administrativo-tecnológico alcançado pela instituição.

Junte-se a isso – e nunca é ocioso repetir -, que o profissional de Administração, além da reunião na sua formação de saberes orientados à eficiência, vale dizer, aos aspectos diretamente associados ao mercado, à consecução de resultados mensuráveis, entre outros, alia também à origem e natureza da profissão, valores humanísticos universais que transcendem aqueles orientados para o fortalecimento da cidadania, da igualdade social, da valorização, do aperfeiçoamento e do desenvolvimento dos seres humanos.

Com a pandemia ficou mais difícil imaginar o futuro. De outra parte, as instituições em geral não podem ficar alheias à nova realidade que advirá pós-coronavírus, ainda que lhes faltem informações e certezas suficientes, de modo a possibilitar-se-lhes a preparação adequada para a travessia, chegada, sobrevivência e sustentabilidade do desconhecido mundo novo.

 

  1. Que será o amanhã?
  2. Que CRA-RJ renascerá pós-pandemia?
  3. Quais são os efeitos da crise sobre o CRA-RJ?
  4. Que trabalho precisa ser feito para que o CRA-RJ atinja seus objetivos, se mantenha e evolua na direção de novo modelo de governança demandado?
  5. Que funções o CRA-RJ tem de exercer internamente e que devem ser asseguradas?

 

Esses questionamentos e outros estão sendo resolvidos no Plano de Retomada de Atividades do CRA-RJ Pós-Coronavírus em fase de formulação.

 

*Adm. Wallace de Souza Vieira
Presidente
 CRA-RJ nº 01-13247