Quando os progressos das Ciências Sociais revelaram que o sentir e o pensar são,   abriram-se os caminhos a formulações bem mais profundas no campo da teoria das organizações.

A premissa hoje prevalecente é a de que o impacto da cultura organizacional (tipo de administração) exerce papel crítico na definição dos padrões de desempenho do indivíduo, das equipes e, portanto, da própria organização.

Tradicionalmente tem-se conferido grande importância em fornecer aos indivíduos maior competência técnica para o exercício de suas funções. Na verdade, assim que se deflagra o processo de implantação dos conhecimentos, habilidades e competências adquiridos, ergue-se a barreira da insensibilidade da cultura organizacional para efetivação da mudança pretendida.

Verifica-se, pois, que o problema não se situa apenas em nível individual. Acima de tudo, a busca da eficiência de gestão corporativa é conseqüência do tipo de formulação que a própria organização define como necessidade. Aumentar a competência técnica individual, portanto, é evidentemente importante, mas se constitui apenas numa dimensão do processo de influenciação do comportamento humano.

Em grande extensão, as pessoas frustram-se em seus esforços individuais, e muitas vezes isolados, contra o volumoso peso do ambiente que diz: “faça como você tem feito no passado”, “não adianta dar murro em ponta de faca”, “papagaio velho não aprende a falar”.

Tome-se, por exemplo, uma pessoa de 45 anos, que gastou toda sua vida desenvolvendo padrões de pensamento e de interação que se tornaram características de seu comportamento. Esses padrões, praticados ao longo de toda uma vida, tendem a se tornar tão fixos e arraigados que se incorporam como sua “segunda natureza”. Manifestam-se sem um momento de reflexão. Internalizam-se nas pessoas. A sua repetição faz com que sejam assimilados ao contexto da própria existência de cada um.

É óbvio que padrões tão consistentes não mudam de pronto. A menor alusão à necessidade de mudar gera resistência. Assim, suponhamos que essa tal pessoa tenha trabalhado por mais de 20 anos numa mesma ambiência organizacional. Esta, por sua vez, também se cristaliza em tradições, práticas do passado, hábitos, costumes e precedentes que lhe conferem peculiaridades singulares.

A cultura organizacional penetra tão profundamente nas pessoas que passa a ser aceita como natural. A organização também tem a sua “segunda natureza”. Ela cega as pessoas: o que já é conhecido e reconhecido passa a ter maior penetração e encontra maior aceitação, quer seja certo ou errado, pois integra a natureza assimilada das pessoas.

Para que aprimoramentos ocorram e as intervenções na cultura das organizações se tornem mais lúcidas e conseqüentes, o esforço de mudança deve processar-se em dois planos distintos:

a) “indivíduos”, com anos de experiências e vivencias sociais próprias;

b) “culturas organizacionais”, diferenciadas e diversificadas, próprias e exclusivas, o que as torna bastante difícil de serem diagnosticadas, em especial em relação a seu desempenho em termos de processo decisório, motivação, planejamento, comunicação, grupos de poder e controle, relacionamento formal versus informal, cliques e panelinhas.

A fusão indivíduo-organização é tão forte que bloqueia a capacidade de perceber e pensar, sentir e agir das pessoas. É uma doce ilusão julgar que a simples exposição a programas educacionais aliados a esforços de reformulações estruturais-funcionais sejam capazes de liberar indivíduos e culturas organizacionais das distorções de suas segundas naturezas assimiladas por anos e anos de prática e de convivência.

Muito se fala de cultura organizacional em programas de treinamento gerencial. Mas, em verdade, os dirigentes corporativos, mesmo nos níveis estratégicos, têm uma “incapacidade treinada” para perceber e atuar sobre a cultura organizacional, pois derivam satisfação psicológica do fazer e do decidir sobre planejamento e controle operacional strictu sensu de suas atividades e responsabilidades de supervisão.

Não se sensibilizam sobre a relevância e a dimensão da cultura organizacional nos resultados corporativos, e muito menos reconhecem os seus efeitos. No mais das vezes, apenas aceitam-na intelectualmente.

A cultura das organizações é como o ar que se respira: sequer nos damos conta de sua presença se algo estranho não lhe for acrescentado. E, assim, a cultura organizacional atua subliminarmente, sem que seus circunstantes dela tomem consciência no cotidiano de trabalho. É como se sequer existisse.

A compreensão de que o estilo gerencial é função simultânea da personalidade do indivíduo, – do líder e dos liderados- e da cultura organizacional passa a ser o primeiro grande passo para que se obtenha resultados mais efetivos de mudança nas organizações. E, a partir daí, o desenvolvimento organizacional se torna uma estratégia permanente e sistemática, que coloca e aplica conceitos e habilidades, técnicas e processos requeridos para efetuar a intervenção planejada na cultura da organização.  Recupera-se o hiato existente entre aquilo que “a organização é e aquilo que ela gostaria de ser”, tendo por base a busca do consenso dos mais diferentes atores e circunstantes que se relacionam intra e inter-organização.

É necessário que as organizações se desnudem ante si mesmas, se autodissequem, avaliem o equilíbrio e a adequação de seus diversos componentes, de seus sistemas técnicos e humanos, analisem a química de sua comunicação interna, de maneira a chegar o mais próximo do autoconhecimento, corrigindo distorções, otimizando o que já for bom e rejeitando o obsoleto e o expletivo.

É claro que não se estabelece de forma perene uma estrutura organizacional. O seu delineamento nada mais é senão a explicitação do conjunto de valores e concepções, aspirações e necessidades, conhecimentos, habilidades e competências que a embasam.

Muito menos do que idealizar estruturas organizacionais pretensamente perfeitas, o executivo deve ter o propósito de promover uma permanente e sistemática conscientização nos diversos escalões da organização com vistas a compartilhar uma linguagem comum de desenvolvimento, de lógica empresarial e de estratégia de negócios.

A cultura organizacional forja o ambiente total de trabalho, define as suas maneiras de pensar, sentir e agir, de decidir e de executar, configura a personalidade da organização, confere-lhe identidade e define o seu DNA. Portanto, configura a sua lógica de argumentação com quaisquer de seus circunstantes, internos ou externos.

Em suma, a cultura organizacional consiste de elementos referentes…

a) Ao Indivíduo:
Premissas,
Atitudes,
Crenças,
Valores,
Expectativas.

b) Á Organização
Precedentes,
Práticas do passado,
Tradições,
Normas e Regras,
Praxes e formalidades,
Ritos.

Assim, permanentemente o Gerente convive com:

– tradições, práticas e precedentes (válidos ou não, conscientes ou não), e

– Necessidade de mudar, de negociar, de confrontar, de articular, de integrar, de argumentar, de convencer, de motivar, de avaliar, de estimular, de corrigir, de educar…

A sua competência gerencial resulta da habilidade que possua em harmonizar esses dois vetores.

A cultura, resumindo, é o ambiente total de trabalho, que consiste de elementos referentes ao indivíduo e à organização.

Os elementos referentes ao indivíduo são as premissas, atitudes, crenças, valores, expectativas, precedentes, critérios e tradições, opções éticas.

Já os elementos relacionados à organização são as idiossincrasias, hábitos, práticas e costumes, praxes e formalidades.

Indivíduo e organização integram-se, tendo como resultantes comportamentos que conduzem à:

  1. Apatia e Indiferença;
  2. Decisões fundamentadas na antiguidade e a experiência, na busca de benefícios e vantagens;
  3. Manutenção do status quo;
  4. Obtenção de resultados a qualquer preço, independentemente de suas repercussões disfuncionais;
  5. Busca da auto-realização no trabalho e da excelência do desempenho organizacional.

O executivo simultaneamente convive com tradições, práticas e precedentes, que estimulam a manutenção do status quo, e com a necessidade de mudar, que exige a alteração do status-quo. A competência gerencial resulta da habilidade que o executivo possua em harmonizar essas duas forças que atuam sobre o seu comportamento no dia-a-dia da organização.

Não faz o menor sentido, portanto, considerar isoladamente tanto o desenvolvimento individual quanto a cultura organizacional. Ambos caminham juntos, como irmãos siameses:

O comportamento= função (I, A)

I=indivíduo
A=Ambiente

A cultura é tão legítima e necessária à operação e à saúde da organização quanto à busca de realização de seus objetivos. A cultura proporciona a base para o pensar, o sentir e o agir das pessoas que integram determinada organização. Determina, portanto, a sua lógica de argumentação, conforma ou plasma o seu discurso e a sua prática.

O desafio que se coloca para os executivos consiste em como formular modelos de excelência organizacional capazes de configurar uma cultura que sustente e reforce os objetivos de busca de lucratividade e da satisfação pessoal.

A maneira viável de se proceder a mudanças efetivas e de se construir uma lógica de argumentação coerente e consistente no ambiente organizacional consiste em intervir em suas culturas, isto é, desenvolver processos de trabalho dentro dos quais as pessoas vivam e convivam, participem e se integrem. O desenvolvimento isolado do indivíduo, de per si, conquanto seja por demais importante, não proporciona o impacto necessário à renovação organizacional ou à transformação de suas práticas, muito menos consagra uma lógica consistente de argumentação no cotidiano de trabalho.

Adm. Wagner Siqueira
CRA-RJ nº 01-02903-7
Presidente